Jovem de 16 anos é atingida no olho por bala de borracha em dispersão de baile funk

Gabi - Leste Online
Jovem de 16 anos foi atingida no olho por bala de borracha em ação da polícia em Guaianases, na Zona Leste de SP — Foto: Arquivo pessoal

Gabriella perdeu a visão do olho esquerdo, segundo médicos do Hospital São Paulo. Polícia Militar disse que usou ‘técnicas de controle de distúrbios para conter a multidão’ e que não houve relato de feridos

G1
12/11/2019 – 20:49


 

Gabi - Leste Online
Jovem de 16 anos foi atingida no olho por bala de borracha em ação da polícia em Guaianases, na Zona Leste de SP — Foto: Arquivo pessoal

 

SÃO PAULO — Uma adolescente de 16 anos foi atingida por um disparo de bala de borracha no olho esquerdo, na madrugada deste domingo (10), na dispersão de um baile funk em uma rua de Guaianases, Zona Leste de São Paulo. Segundo Kelly Talhaferro, mãe de Gabriella Talhaferro, ela perdeu a visão do olho, em diagnóstico feito por oftalmologistas e cirurgiões do Hospital São Paulo, na Vila Clementino.

Procurada, a Polícia Militar disse que “policiais do 28º BPM/M realizavam a operação ‘Noite Tranquila’, com o objetivo de coibir ocorrências de perturbação de sossego, quando, cerca de 700 pessoas, obstruíram a rua citada, sendo necessário o uso de técnicas de controle de distúrbios para conter a multidão”. A corporação informa ainda que não houve relatos de feridos e que a Polícia Civil não localizou registros de boletins de ocorrência.

De fato, a jovem ainda não registrou o ocorrido em uma delegacia porque estava internada no Hospital São Paulo, onde passou por cirurgia neste domingo (10). A mãe, Kelly, disse ao G1 que o boletim será o primeiro passo. “Primeiramente, quero que os responsáveis sejam punidos”, disse a mãe. Ela disse que irá entrar “com todas as medidas cabíveis” para buscar justiça ao caso.

No laudo de alta, o Hospital diz que a jovem teve “trauma ocular no olho esquerdo com bala de borracha” (veja abaixo).

Diferente do relato da Polícia Militar, a jovem afirma que a multidão já havia sido dispersada quando ela foi atingida. “Eles já tinham dispersado as pessoas. Na hora que eu estava na rua, que eu fui atingida, já não tinha quase ninguém na rua”, disse Gabriella.

Agência Netpress

O baile conhecido como “Beira do Rio” acontece na Travessa Seringais. Segundo a adolescente, por volta de 1h da madrugada de sábado para domingo, a polícia já estava no local e o baile havia parado. Por volta das 2h30, ela disse que estava em frente a uma adega, com um amigo, quando policias jogaram uma bomba de gás em direção aos dois. “Eu falei, Biel, corre. Nisso, eles estavam passando com o carro na rua, e eles atiraram”.

Era a segunda vez que Gabriella ia ao local. Depois de ser atingida, ela foi levada para a UPA de Itaquera, e em seguida transferida de ambulância para o Hospital Municipal Alípio Corrêa Netto, em Ermelino Matarazzo. De lá, foi transferida mais uma vez para o Hospital São Paulo, onde fez cirurgia. Segundo a mãe de Gabriella, agora ela será acompanhada para avaliar se é possível manter o globo ocular e não ter que removê-lo.

Alta - Leste Online
Resumo da alta da jovem, do Hospital São Paulo, cita bala de borracha e explica que foi feita cirurgia para reconstrução de câmara interior do olho — Foto: Arquivo pessoal

“Ela está sofrendo muito. Tem horas que ela fica um pouco mais animada, e tem horas que se revolta, diz que deveria ter morrido”, contou a mãe.

O ouvidor das polícias de São Paulo, Benedito Mariano, disse ao G1 que foi procurado pelo ativista de direitos humanos Darlan Mendes, que está prestando apoio à família, e que, após ouvi-los, irá solicitar investigação. “Vou abrir procedimento na Ouvidoria e encaminhar para a Corregedoria da PM”, disse o ouvidor.

Sobre o uso de balas de borracha em ações de dispersão de bailes funks, Mariano disse que, mais do que discutir o uso do equipamento, o importante é discutir a forma como foi utilizado. “Bala de borracha, apesar de ser não letal, pode matar dependendo de onde pega. E pode trazer sequelas para o resto da vida”.

Gabriella e Kelly - Leste Online
Gabriella com sua mãe, Kelly, após cirurgia no olho esquerdo, atingido por bala de borracha em ação da polícia — Foto: Arquivo pessoal

Outros casos

Em 2015, um adolescente de 15 anos ficou cego do olho esquerdo após ser atingido por um tiro de borracha disparado por um policial militar do 47º Batalhão, na madrugada de domingo, na Brasilândia, na Zona Norte de São Paulo.

A polícia dispersava um baile funk perto da casa dele, que não estava na festa. Segundo a família, ele foi baleado depois que a mãe viu uma mulher ser agredida e começou a reclamar com os policiais. Ele estava em casa com os pais e irmãos. “Perdi o olho, não foi a vida. Fico preocupado com meus pais”, disse o jovem.

Em 2013, a estudante Dayane de Oliveira perdeu o olho esquerdo após o disparo de uma bala de borracha em uma viela de Paraisópolis, favela da Zona Sul de São Paulo. Segundo a adolescente contou à reportagem na época, por volta das 3h ela se divertia com o namorado e o irmão mais velho em um bar quando viu um carro da PM parar. Ela afirma que policiais desceram e mandaram o grupo sair do local. Para apressar, eles jogaram bombas de gás.

Na correria, parte do grupo se refugiou em uma viela. Temendo ser pisoteada, Dayane foi para outro beco. “Eu olhei para baixo e vi as bombas caindo perto de mim. Quando levantei o rosto, senti uma pancada forte”, disse

Na época, a PM informou, em nota, que na ocasião “os policiais militares foram acionados para atender ocorrência de perturbação do sossego, originada em baile funk em via pública (pancadão)”. Os policiais alegam, segundo a assessoria da corporação, que “os participantes se negaram a ser socorridos ou auxiliados”.