Gestor também responde pelo crime de prevaricação. Ele e superintendente de autarquia transferiram cinco servidores por ‘retaliação’ após reportagens, diz Promotoria
G1
SÃO PAULO — A Justiça de São Paulo aceitou denúncia contra o diretor do Hospital Municipal Dr. Carmino Caricchio – Hospital Municipal do Tatuapé, na Zona Leste da capital paulista, por descumprimento de medida sanitária preventiva e crime de prevaricação (praticado por funcionário público contra a administração pública).
Segundo investigação do Ministério Público, José Carlos Ingrund não ofereceu equipamentos de proteção individuais (EPIs) e estrutura adequada a profissionais de saúde para evitar a transmissão da Covid-19 entre os funcionários e pacientes.
A Promotoria diz ainda que o gestor do hospital transferiu irregularmente cinco funcionários da unidade de saúde após reportagens denunciarem as falhas.
A GloboNews entrou em contato com a Prefeitura de São Paulo, responsável pela Secretaria Municipal de Saúde (SMS) e pela Autarquia Hospitalar Municipal de SP, que disseram, por meio de nota, que “prestaram todas as informações e esclarecimentos necessários, solicitados pelas autoridades responsáveis. A SMS está à disposição das autoridades para o que couber”.
“Desde o início da pandemia, nos equipamentos da rede municipal, não faltaram Equipamentos de Proteção Individual (EPI) aos profissionais de saúde da rede municipal, que por todo o período mantiveram o empenho em salvar vidas”, completou a pasta da Saúde.
No dia 7 de abril de 2020, o SP2 revelou denúncias de funcionários e parentes de pacientes do Hospital Municipal do Tatuapé como a falta de EPIs no atendimento.
Em imagens gravadas por um funcionário, 14 pacientes apareciam em uma sala do Pronto-Socorro do hospital. A sala de observação também teria se transformado em uma unidade semi-intensiva improvisada, onde a maioria dos pacientes estavam entubados e sedados.
No mesmo mês, a Promotoria iniciou a investigação para apurar os relatos das condições precárias dos trabalhadores para o atendimento de pessoas contaminadas ou com suspeita da Covid-19, além do descumprimento do distanciamento entre os leitos dos pacientes mesmo sem superlotação, aglomeração de pacientes com suspeita e confirmação da doença e suposta omissão na emissão de certificados de óbitos dos pacientes, sem a menção à suspeita de Covid-19 como possível causa da morte.
Na denúncia oferecida e aceita pela Justiça de São Paulo no dia 12 de abril de 2021, o MP diz que ficou comprovado em laudo pericial que profissionais da saúde exercendo suas funções sem os EPIs adequados, além da falta de sistemas de trocas de exaustão de ar, distanciamento entre leitos, separação entre casos confirmados e suspeitos, fluxo constante de funcionários e pessoas, inclusive não contaminadas por Covid-19, dentre outros.
A partir disso, foi possível constatar a responsabilidade do diretor pelo descumprimento das normas sanitárias, que poderiam ter impedido a propagação de doença no local, ainda de acordo com a denúncia.
Já em relação à superintendente da Autarquia Hospitalar Municipal de São Paulo Magali Vicente Proença, o TJ aceitou o pedido da Promotoria e determinou que ela seja ouvida em audiência preliminar. Até o momento, ela não é ré no processo.
‘Retaliação’ e remanejamento de servidores
Após a denúncias feitas pela imprensa, o MP diz que cinco servidores da unidade foram transferidos para outros locais pela Superintendente da Autarquia Hospitalar Municipal de São Paulo, Magali Vicente Proença, com a justificativa de que havia a necessidade de reforçar equipes de trabalho em outras unidades.
Segundo os investigadores, no entanto, foi verificado que os servidores foram removidos do Hospital Municipal do Tatuapé “como uma forma de retaliação”, exercida pelo diretor do hospital, José Carlos Ingrund, em conjunto com a superintendente da Autarquia Hospitalar Municipal de São Paulo, “devido à suspeita de que tais servidores teriam colaborado para a produção das reportagens jornalísticas.”
A denúncia do MP afirma que a transferências dos servidores lotados no Hospital Municipal do Tatuapé não encontra respaldo, principalmente pelo fato da unidade de saúde ter as mesmas dificuldades ou até superiores em relação aos demais hospitais da rede pública que atuam no combate à epidemia da Covid-19.
A Promotoria usa como base a análise dos relatórios de fiscalização do Conselho Regional de Enfermagem (COREN/SP) e do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp) que apontaram problemas no gerenciamento e planejamento da equipe de enfermagem, por consequência da falta de funcionários nessas áreas.
O Ministério Público defende ainda que além do déficit de profissionais demonstrados nos relatórios, o Hospital Municipal do Tatuapé acumulou mais de 180 afastamentos em um período de 15 dias no começo da pandemia, e por isso pede na ação a mudança na direção do hospital, “a fim de evitar novas retaliações ou perseguições na unidade”.
Durante a investigação, o MP apurou ainda denúncias de que o hospital teria sido negligente e deixado de fazer a notificação sobre pacientes com teste positivo para Covid-19 que morreram em decorrência da doença. Mas a Promotoria afirmou que não foram identificados elementos que comprovassem as denúncias e arquivou os relatos sobre o crime de notificação de doença compulsória.
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